"DISCRIMINAÇÃO E CASAMENTO: UM OLHAR CONSTITUCIONAL
“Igualdade é tratamento igual de realidades iguais e tratamento desigual de realidades desiguais.”
‘Jorge Miranda – Constitucionalista e Professor Universitário’
“Igualdade é tratamento igual de realidades iguais e tratamento desigual de realidades desiguais.”
1. O artigo 13º da Constituição proclama que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, acrescentando que ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação econômica, condição social ou orientação sexual.
Os factores de desigualdade assim apresentados são-no a titulo enunciativo, e não taxativo. Eles equivalem aos mais flagrantemente reconhecidos pelo legislador constitucional; não os únicos susceptíveis de gerar privilégios ou discriminações e, portanto, não os únicos rejeitados.
Já era assim antes da revisão constitucional de 2004 no tocante á orientação sexual. O ser ela agora mencionada no artigo 13º (por copia da Carta dos Direitos Fundamentais da União Européia) representa apenas uma explicitação.
2. A proibição de discriminações significa, à partida, que ninguém possa deixar de ter acesso a qualquer direito ou nbem jurídico atribuído pela Constituição ou pela lei em termos gerais. Mas o principio tem de ser entendido no contexto da Constituição, com as implicações decorrentes de outros princípios. E isso porque o principio da igualdade não funciona por forma geral e abstrata, mas perante situações ou termos de comparação que devam reputar-se concretamente iguais – e, antes de tudo, à luz de padrões valorativos ou da ordem axiológica constitucional (parecer nº 32/82 da Comissão Constitucional).
Enquanto conceito relacional, a medida do que é igual e deva ser tratado como igual depende da matéria a tratar e do ponto de vista de quem estabelece a comparação, em termos de determinar quais são os elementos essenciais e os não-essenciais num juízo acerca da admissibilidade ou inadimissibilidade de soluções jurídicas dissemelhantes e eventualmente mesmo discriminatórias. Ou seja, quando é que duas situações reais da vida são equiparáveis, quando as similitudes entre elas sobrelevam das diferenças e, por isso, o juízo de valor sobre a materialidade que lhes serve de suporte conduz à necessidade de um igual tratamento jurídico (acórdão nº 231/94 do Tribunal Constitucional).
É a esta luz que deve ser encarado o problema do casamento de homossexuais.
3. Igualdade é tratamento igual de realidades iguais e tratamento desigual de realidades desiguais. Por isso, diferenciar não é discriminar. Não diferenciar é que é (ou pode ser) discriminar.
Reduzir o casamento à finalidade de procriação, como alguns sustentam, não se afigura correcto. Simplesmente, apenas o casamento de pessoas de sexos diferentes comporta a potencialidade de procriação, com tudo quanto isto envolve de direitos e deveres em relação aos filhos e à função de assegurar a sustentabilidade (quer biológica, quer no plano da sustentabilidade da segurança social) e a renovação da comunidade. Não por acaso a Constituição qualifica a maternidade e a paternidade como ‘valores sociais iminentes’ (artigo 68º número 2º).
Não admitir o casamento de dois homens ou de duas mulheres não viola o principio de igualdade. O que o infringiria seria, sim, admiti-lo, por colocar em paridade realidades inconfundíveis.
4. A Lei Fundamental distingue o direito de constituir família e o direito de casar (artigo 36º, numero 1º) e hoje parece à vista desarmada a pluralidade de formações familiares, designadamente, as uniões de facto, tanto heterossexuais como homossexuais (com direitos consagrados na Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, e que bem poderão vir a ser alargados). Em contrapartida, é não menos patente, na Constituição, o enlace incindível entre filiação e casamento, necessariamente heterossexual. “Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto á capacidade civil e à manutenção e educaçao de filhos (artigo 36º, numero 3º). “Os filhos nascidos fora do casamento não podem ser objecto de qualquer discriminação” (artigo 36º, numero 4º). “Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos” (artigo 36º, numero 5º). “Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial (artigo 36º, numero 6º). À pluralidade de formações familiares hão-de corresponder adequados regimes jurídicos.
5. Ainda mais claro se mostra a Declaração Universal dos Direitos do Homem: “A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça ou religião (artigo 16º, numero 1º).
Ora, os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigo 16º, numero 2º da Constituição).
Logo, em face do nosso ordenamento constitucional, não só não faz discriminação por se estabelecer diferenças entre o regime do casamento e o regime (ou qualquer regime) da união homossexual como o casamento é concebido exclusivamente como união heterossexual. Logo, uma lei que permitisse casamentos entre pessoas do mesmo sexo seria inconstitucional.".
Os factores de desigualdade assim apresentados são-no a titulo enunciativo, e não taxativo. Eles equivalem aos mais flagrantemente reconhecidos pelo legislador constitucional; não os únicos susceptíveis de gerar privilégios ou discriminações e, portanto, não os únicos rejeitados.
Já era assim antes da revisão constitucional de 2004 no tocante á orientação sexual. O ser ela agora mencionada no artigo 13º (por copia da Carta dos Direitos Fundamentais da União Européia) representa apenas uma explicitação.
2. A proibição de discriminações significa, à partida, que ninguém possa deixar de ter acesso a qualquer direito ou nbem jurídico atribuído pela Constituição ou pela lei em termos gerais. Mas o principio tem de ser entendido no contexto da Constituição, com as implicações decorrentes de outros princípios. E isso porque o principio da igualdade não funciona por forma geral e abstrata, mas perante situações ou termos de comparação que devam reputar-se concretamente iguais – e, antes de tudo, à luz de padrões valorativos ou da ordem axiológica constitucional (parecer nº 32/82 da Comissão Constitucional).
Enquanto conceito relacional, a medida do que é igual e deva ser tratado como igual depende da matéria a tratar e do ponto de vista de quem estabelece a comparação, em termos de determinar quais são os elementos essenciais e os não-essenciais num juízo acerca da admissibilidade ou inadimissibilidade de soluções jurídicas dissemelhantes e eventualmente mesmo discriminatórias. Ou seja, quando é que duas situações reais da vida são equiparáveis, quando as similitudes entre elas sobrelevam das diferenças e, por isso, o juízo de valor sobre a materialidade que lhes serve de suporte conduz à necessidade de um igual tratamento jurídico (acórdão nº 231/94 do Tribunal Constitucional).
É a esta luz que deve ser encarado o problema do casamento de homossexuais.
3. Igualdade é tratamento igual de realidades iguais e tratamento desigual de realidades desiguais. Por isso, diferenciar não é discriminar. Não diferenciar é que é (ou pode ser) discriminar.
Reduzir o casamento à finalidade de procriação, como alguns sustentam, não se afigura correcto. Simplesmente, apenas o casamento de pessoas de sexos diferentes comporta a potencialidade de procriação, com tudo quanto isto envolve de direitos e deveres em relação aos filhos e à função de assegurar a sustentabilidade (quer biológica, quer no plano da sustentabilidade da segurança social) e a renovação da comunidade. Não por acaso a Constituição qualifica a maternidade e a paternidade como ‘valores sociais iminentes’ (artigo 68º número 2º).
Não admitir o casamento de dois homens ou de duas mulheres não viola o principio de igualdade. O que o infringiria seria, sim, admiti-lo, por colocar em paridade realidades inconfundíveis.
4. A Lei Fundamental distingue o direito de constituir família e o direito de casar (artigo 36º, numero 1º) e hoje parece à vista desarmada a pluralidade de formações familiares, designadamente, as uniões de facto, tanto heterossexuais como homossexuais (com direitos consagrados na Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, e que bem poderão vir a ser alargados). Em contrapartida, é não menos patente, na Constituição, o enlace incindível entre filiação e casamento, necessariamente heterossexual. “Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto á capacidade civil e à manutenção e educaçao de filhos (artigo 36º, numero 3º). “Os filhos nascidos fora do casamento não podem ser objecto de qualquer discriminação” (artigo 36º, numero 4º). “Os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos” (artigo 36º, numero 5º). “Os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial (artigo 36º, numero 6º). À pluralidade de formações familiares hão-de corresponder adequados regimes jurídicos.
5. Ainda mais claro se mostra a Declaração Universal dos Direitos do Homem: “A partir da idade núbil, o homem e a mulher têm o direito de casar e de constituir família, sem restrição alguma de raça ou religião (artigo 16º, numero 1º).
Ora, os preceitos constitucionais e legais relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigo 16º, numero 2º da Constituição).
Logo, em face do nosso ordenamento constitucional, não só não faz discriminação por se estabelecer diferenças entre o regime do casamento e o regime (ou qualquer regime) da união homossexual como o casamento é concebido exclusivamente como união heterossexual. Logo, uma lei que permitisse casamentos entre pessoas do mesmo sexo seria inconstitucional.".
‘Jorge Miranda – Constitucionalista e Professor Universitário’