São Todos Génios, Excepto Eu


Faz bastante tempo que ando de costas voltadas com a situação sociopolítica do meu país, a Guiné-Bissau, por razões vituperiosas manifestamente cognoscíveis por todos. Neste momento não sinto praticamente qualquer tipo de orgulho na minha pátria. Ela está completamente arruinada até aos calcanhares, ficando a mercê da deriva dos usurpadores do poder e sem qualquer tipo de alternativa política convincente para inverter o precipício das coisas. 

Perdemos a soberania, que tanto serviu de pretexto para desencadear a maldita luta de libertação nacional (LER), adulteramos o conceito da liberdade, da dignidade, e do respeito, e conformamo-nos resignadamente com a ditadura militar sem fim à vista. 

Os ditos arautos da esperança, que não passam de mais uns autênticos oportunistas políticos (ndaures kuka bali sê cabeça pá nada di es mundu!) conluiaram-se com os inqualificáveis militares para oprimirem, sem dó até à exaustão, o povo guineense, expondo-o ao opróbrio e vil sofrimento. Como consequência imediata de toda essa horrenda malignidade consentida gerou-se uma amálgama profunda no seio da nossa genuína sociedade, criando assim rupturas enormes entre os guineenses e acentuando negativamente as rivalidades étnicas já existentes. 

Vislumbrando no geral a elite política da sociedade guineense (se é que há elite na Guiné), é fácil reconhecer que não temos praticamente pessoas dignas de referência que possam,  quer servir de modelo inspirador para os nossos jovens, quer prosseguir aquela que deveria ser a sua suprema e principal função: a de alimentar e devolver de novo a esperança perdida ao abatido povo guineense nos momentos críticos como estes que o país está arduamente a enfrentar. Infelizmente, a realidade prática tem-nos demonstrado que são todas almas sujas pela corrupção ao longo dos anos, capazes de uma única volúpia (a de adquirir ou de não perder) e ansiosas por tudo o que possa satisfazer de imediato os seus insaciáveis caprichos. 

É este conjunto de coisas que faz com que eu fique cada vez mais alheado, céptico e bastante revoltado com o futuro do meu país, perdendo por completo o entusiamo e orgulho nele. O pior de tudo é ver alguns guineenses que fecham os olhos a esta realidade anormal, fingindo que nada esteja a acontecer. Julgam-se patriotas e orgulhosos da sua identidade guineense, sem terem consciência do ridículo que estão a ser por via da falsidade e da falta da solidariedade para com os seus opressores patrícios que estão completamente destituídos da estabilidade governativa e da esperança de vida. De modo nenhum isto pode ser amor a pátria. Amar o nosso país é estarmos, acima de tudo, preparados para denunciar todos os flagelos que o afectam e o fazem retroceder do rumo ao desenvolvimento. 

Tenho a plena certeza que, mais cedo ou mais tarde, a Guiné-Bissau vai erguer-se e libertar-se definitivamente destes seus malfeitores filhos; no entanto, não há margem de dúvida que até lá muitas coisas funestas vão acontecer, e que hoje poderiam ser evitadas, tais como golpes de estados desnecessários, perdas de vidas humanas, adiamento massivo do futuro próspero da maioria dos guineenses, etc.