“O objecto da doutrina social da igreja é essencialmente o
mesmo que constitui e motiva a sua razão de ser: o homem chamado à salvação e,
como tal, confiado por Cristo à cura e à responsabilidade da Igreja. Com a
doutrina social, a Igreja preocupa-se com a vida na sociedade, ciente de que da
qualidade da experiência social, ou seja, das relações de justiça e de amor que
a tece, dependem de modo decisivo a tutela e promoção das pessoas, para as
quais toda a comunidade é constituída. Efectivamente, na sociedade estão em
jogo a dignidade e os direitos das pessoas e a paz nas relações entre pessoas e
entre comunidades de pessoas. Bens estes que a comunidade social deve perseguir
e garantir. Nesta perspectiva, a doutrina social cumpre uma função de anúncio,
mas também de denúncia. Em primeiro lugar, o anúncio do que a Igreja tem de
próprio: «uma visão global do homem e da humanidade». E isto não só ao nível
dos princípios, mas também ao nível prático. A doutrina social, com efeito, não
oferece somente significados, valores e critérios de juízo, mas também as
normas e as directrizes de acção que daí decorrem. Com a sua doutrina social, a
Igreja não persegue fins de estruturação e organização da sociedade, mas de
apelo, orientação e formação das consciências. A doutrina social comporta
também um dever de denúncia, em presença do pecado: é o pecado de injustiça e
de violência que de vário modo atravessa a sociedade e nela toma corpo. Tal
denúncia faz-se juízo e defesa dos direitos ignorados e violados, especialmente
dos direitos dos pobres, dos pequenos, dos fracos, e tanto mais se intensifica
quanto mais as injustiças e as violências se estendem, envolvendo inteiras
categorias de pessoas e amplas áreas geográficas do mundo, e dão lugar a
questões sociais, ou seja, a opressões e desequilíbrios que conturbam as
sociedades. Boa parte do ensinamento social da Igreja é solicitado e
determinado pelas grandes questões sociais, de que quer ser resposta de justiça
social. O intento da doutrina social da Igreja é de ordem religiosa e moral.
Religioso porque a missão evangelizadora e salvífica da Igreja abraça o homem «na
plena verdade da sua existência, ser pessoal e ser comunitário e social. Moral
porque a Igreja visa um «humanismo total», vale dizer a «libertação de tudo
aquilo que oprime o homem» e o «desenvolvimento integral do homem todo e de
todos os homens». A doutrina social indica e traça os caminhos a percorrer por
uma sociedade reconciliada e harmonizada na justiça e no amor, antecipadora na
história, de modo incoativo e prefigurativo, daqueles «céus novos e […] nova
terra, onde habita a justiça» (2Pe 3, 13).”
(Extraído in “Compêndio da Doutrina Social da Igreja”, Editora,
Principia, pág. 66,67,68, São João de Estoril, Cascais, 2005)