A maioria dos crentes Evangélico-protestantes vive obcecada pela figura do Diabo, como se este já não tivesse sido definitivamente derrotado por Jesus Cristo, em quem agora depositam inteiramente as suas vidas, assumindo o compromisso de ajustar inteiramente os desígnios da Sua Santa Palavra no seu testemunho Cristão diário.
Vem isto a propósito do facto de eu ter constatado, ao longo dos tempos, no meio Evangélico, um sentimento generalizado e inconsciente de avidez em falar sistematicamente do Diabo, descuidando assim o cerne do foco espiritual, que consiste sobretudo em centralizar os actos de louvor e de adoração exclusivamente na pessoa de Jesus Cristo e na sua obra redentora na cruz de calvário em favor da Humanidade outrora perdida (Efésios 2:1-10).
Os crentes andarem sempre a falar do Diabo, não é novidade para qualquer Evangélico comprometido. É uma realidade, infelizmente, manifesta em todas as denominações Protestantes, com uma ênfase mais acentuada nos círculos Pentecostais, Neopentecostais e Carismáticos, em que praticamente todo o testemunho Cristão fica esgotado na exortação e em tácticas espirituais duvidosas de como lidar com as artimanhas do Diabo, pondo assim de parte o real ensino da Palavra de DEUS, que consiste, sobretudo, em doutrinar as pessoas sobre os grandes Princípios e Valores da Fé Cristã, e, deste modo, prepará-las inabalavelmente para qualquer tipo de embate espiritual que eventualmente possa surgir, ajudando-as a perseverar na fé até ao Juízo Final.
Não é de agora que os crentes dão demasiada importância à figura do Diabo. Tal realidade vem desde os primórdios do Cristianismo, concretamente do segundo século da nossa era, penetrando pela Idade Média, pela Reforma Protestante e persistindo ideologicamente até aos nossos dias coevos. Está subjacente no pensamento dos Pais da Igreja, no de Martinho Lutero, João Calvino, Ulrich Swinglio e Menno Simões, embora de uma forma bastante ténue e subtil, em comparação com os tempos modernos que vivemos.
O facto de eu trazer à tona a exagerada importância que os crentes Evangélicos dão ao Diabo não deve ser entendido, de modo nenhum, como uma subvalorização do seu poder destruidor (ilibando-o do papel negativo que exerce ininterruptamente na vida dos remidos de Cristo, tentando a todo custo que eles se rebelem contra DEUS), nem como uma ideia de que os crentes devessem ignorá-lo, fazendo de contas que ele não existe. Nada disso. Não é a concepção doutrinária que defendo. Infelizmente, há quem no meio Cristão pense assim. Não comungo deste entendimento redutor, que não tem qualquer tipo de sustentáculo bíblico. Pretendo sim denunciar uma prática completamente enraizada e reiterada no nosso meio Evangélico-Protestante, que não contribui em nada para a nossa maturidade espiritual.
Realmente o Diabo existe e continua perigoso em todos os aspectos da sua actuação. O seu grande objectivo primordial é desorientar e arruinar, de forma definitiva, os filhos de DEUS, levando-os para a arena do pecado e, consequentemente, para a perdição eterna. E é justamente por esta razão que leva João Calvino, o conceituado Teólogo Protestante do séc. XVI, a afirmar peremptoriamente que "Satanás (…) mil vezes por dia nos tira do caminho certo" (citado por Timothy George, in Teologia dos Reformadores, pág. 244, Vida Nova, São Paulo – SP, 2004).
Como é do conhecimento da maioria dos Cristãos, ou pelo menos presumo, o Diabo é a causa inicial e última de todos os males existentes no mundo: é uma autêntica encarnação do mal na sua pura e multiforme configuração. Foi ele que induziu engenhosamente Adão e Eva a desobedecerem claramente às ordens expressas de DEUS no início da criação (Génesis 3:1-7), e, hoje, continua a fazê-lo. O Apóstolo Pedro, de forma manifesta, apelida-o como o nosso "adversário, andando em redor, como leão que ruge procurando alguém para devorar" (1 Pedro 5:8). Jesus, a seu respeito, sustenta: "foi homicida desde o princípio e jamais se firmou na verdade, porque nele não há verdade. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira" (Evangelho S. João 8:44). Com efeito, somos desafiados a não lhe dar a mínima manobra de oportunidade (Efésios 4:27), mas sim resistir-lhe firme e constantemente na fé, através da obediência plena à Palavra de DEUS. Em consequência disso, ele fugirá de nós (Tiago 4:7).
Por conseguinte, para concretizarmos estes elevados propósitos bíblicos e triunfarmos espiritualmente precisamos, em primeiro lugar, de nos revestirmos fortemente de toda a armadura de DEUS, "orando em todo o tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica incessante por todos os santos" (Efésios 6:10-18).
Tendo
presente estas importantes verdades da salvação nas nossas vidas, uma
coisa é estarmos inteiramente cientes da grande batalha espiritual em que
estamos envolvidos, contra os principados, contra as potestades, contra os
príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos
lugares celestiais e, por fim, contra o próprio Diabo (Efésios 6:12). Outra
coisa, e bem diferente, é atribuir-lhe tamanha ênfase ao ponto de o colocar no
pináculo da nossa vida espiritual, que ele não merece, o que é de todo de
rejeitar.
Não
consigo compreender o porquê do Diabo ter sempre o mesmo protagonismo no nosso
testemunho Cristão diário (mesmo sendo no sentido negativo, obviamente) com
o nosso eterno DEUS. O mais grave de tudo isto é quando o púlpito sagrado é
usado para tal ignóbil postura. É caso para dizer que pecamos grosseiramente pela
forma, pelo procedimento e pela substância daquilo que deveria ser a nossa impoluta
adoração.
Acredito,
infelizmente, que muitos o fazem de boa-fé, julgando que quanto mais falarem do
Diabo mais estão a glorificar a DEUS. É um erro monumental pensar assim.
Não é necessariamente exaltar o nome de DEUS, trazendo constantemente à colação
as más obras do Diabo. Só o facto de DEUS ser Aquilo que É através dos seus Excelentes
Atributos morais, e sermos o Seu incondicional povo eleito, são motivos
totalmente suficientes de louvá-Lo e Adorá-Lo permanentemente.
O
alcance prático da vida Cristã não é temer o Diabo e muito menos estar
constantemente a falar dele, como a maioria dos crentes erradamente julgam. Ela
envolve uma vida ininterrupta de santidade (1 Pedro 1:13-16) e visceralmente de alegria, oração e acções de graças
a todo o tempo ao nosso Altíssimo e Todo-Poderoso DEUS, por aquilo que É, e
pelo que fez por nós, pecadores (1 Tessalonicenses 5:16-22), principalmente no que toca à maravilhosa
dádiva da salvação que ELE nos outorgou, mediante o sacrifício reconciliatório
do Seu amado Filho Jesus Cristo para a nossa perfeita redenção. Confundir estas
duas realidades inconfundíveis, é demonstrar uma visão limitada do conhecimento
das Sagradas Escrituras e ofuscar o
brilho e a beleza da verdadeira adoração que a Palavra de DEUS nos insta
continuamente a fazer.
Jamais
devemos subestimar o poder demolidor do Diabo, bem como ficar amedrontados com
ele ao ponto de estar a falar dele por tudo e por nada, uma vez que o maior é o
que está em nós e não o que está no mundo (1 João 4:4). E mais, ele
já foi definitivamente derrotado na cruz de calvário: Cristo venceu-o e
deixou-nos a promessa de também vencermo-lo na força do Seu Poder. Por isso, somos
mais que vencedores, por meio daquele que nos amou (Romanos 8:37). É isto que
nos deve alegrar e preencher a nossa rotina espiritual em todos os momentos,
dias, meses, anos e até à consumação dos séculos. Que assim seja!