Memórias do Tempo de Adolescência em Bissau


(Na foto, da esquerda à direita: Jailton, Clariovaldo Enias Tavares [Vlá], Ivan Agostinho Ialá [Vá], Nelson, Papís Gomes, eu, Cindia Gomes, Caty, Wiltem Samira Ialá, Wesley Pereira Miranda [Wé]. Foi tirada em Junho de 1998, em Bissau). 


Não me considero propriamente uma pessoa saudosista. Concebo a vida numa perspectiva de fases, algumas boas, outras nem tanto. Com efeito, todas elas contribuem decisivamente para aperfeiçoarmos o nosso carácter interior, mormente na maneira eficaz de responder aos desafios diários que a vida nos impõe, de modo a que possamos vivê-la intensamente nas suas variadas formas. 

Não deixo, contudo, de reconhecer que há momentos únicos na vida, que dificilmente esqueceremos. No meu caso em particular (além de tantos outros bons e inesquecíveis ocasiões que já tive a oportunidade de vivenciar ao longo do meu percurso de vida), destaco a minha adolescência em Bissau. Apesar de esta ser uma fase de enormes contradições a nível do desenvolvimento pessoal de qualquer ser humano, nomeadamente no que toca, parafraseando "O Jansenista", a zangas, a ciúme, a ansiedades, a preconceitos, a malícias, a desejos, a desencontros relacionais e a toda uma torrente de sentimentos hipertrofiados que fazem da adolescência uma passagem única e ao mesmo tempo deliciosa e perigosa, anseio-a novamente de volta. 

É em redor de toda esta maleabilidade comportamental que se caracteriza esta áurea fase da adolescência que os especialistas apelidam "fase da perdição". Sinto imenso a falta deste tempo em Bissau, especialmente de estar ao pé da minha gente. De viver despreocupadamente como se amanhã não existisse. De voltar a ser aquele adolescente que outrora fui. De ser restringido na minha liberdade. De viver pelas ordens e imposições dos meus familiares. Usufruir de presença agradável dos meus amigos e colegas de infância. Ter a simplicidade e espontaneidade de meninice. Jogar à bola descalço de baixo de intensa chuva tropical e de debater diversos assuntos dignos de um adolescente. Ser, acima de tudo, dependente. 

O que poderia ser para mim surreal na minha feliz adolescência hoje em dia encaro-o com naturalidade como sendo um ideal de vida, depois de tantas simbioses de experiências vividas ao longo dos anos. Jamais esquecerei a minha cidade natal que tanto amo, Bissau, nem tão pouco a minha adolescência. Com isso não me considero, de modo nenhum, patriota. Recuso liminarmente esta redutora conotação. Sou universalista em todos os aspectos. Trata-se, a meu ver, de uma visão holística da vida e do mundo que nos rodeia, que por sua vez abarca toda a sua dimensão multifacetada e plena.