Perante as constantes divergências políticas manifestamente conhecidas no seio da coligação governamental do PSD e CDS/PP não havia qualquer dúvida de um dia ressurgir uma crise política como a que estamos a assistir impavidamente, e que, por enquanto, desconhecemos na íntegra o seu real alcance prático e implicações que terá na vida dos portugueses.
Sem querer propriamente defender ou condenar alguém, julgo desnecessária a demissão do Ministro das Finanças, Victor Gaspar (LER), não obstante as sérias razões que certamente deverá ter e, sobretudo, o descrédito generalizado que tem suscitado na opinião pública portuguesa. Em termos gerais, a sua permanência no Governo até a TROIKA deixar Portugal, no próximo ano, era um mal menor em comparação com a sua prematura saída antes daquela data.
E mais, a decisão de Passos Coelho em nomear a ex-Secretaria do Tesouro para o cargo da Ministra das Finanças, Maria Luís Alburquerque, foi uma decisão extremamente imprudente do ponto de vista político, como agora se está a verificar com a súbita demissão de Paulo Portas, ontem de manhã. Da mesma sorte, usando acertada expressão de um grande comentador, Paulo Portas “precipitou-se muito” ao ter pago na mesma moeda a intransigência de Passos Coelho em não recuar com o nome do agora Ministra das Finanças para o mesmo cargo, ignorando assim o seu parceiro da coligação (obviamente, fazendo fé a declaração tornada pública por Paulo Portas, na apresentação da sua "irrevogável" demissão [LER]).
Tudo isto para concluir que Vitor Gaspar, Paulo Portas e principalmente aquele a quem cabe a maior responsabilidade política, Passos Coelho, ficaram muito aquém das suas responsabilidades políticas: pensaram-se mais nos seus interesses particulares do que propriamente no do país.
Resta-nos esperar serenamente o evoluir da situação nos próximos dias: se os dois ministros do CDS/PP vão igualmente demitir-se como já está a ser veiculado nos media e, consequentemente, retirar a confiança política ao Governo; ou optará tão-somente por sair do governo, sem no entanto fazer cair o mesmo, através de um acordo de incidência parlamentar; ou por fim, ficar no Governo sem no entanto contar com o seu líder, Paulo Portas e continuar tudo na mesma. Parece-me provável a segunda opção, com consequências políticas atenuantes, no sentido de não complicar vida ao Governo no Parlamento, procurando, na medida do possível, abstrair-se nas votações das medidas para não levar a queda do Governo, ou seja, assegurar a estabilidade governativa, que parece um pouco surreal e contraditório à luz do que estamos a assistir (LER).
Até lá é tudo uma questão de tempo para sabermos verdadeiramente o final da história. Agora uma coisa é certa: toda esta celeuma política criada desde anteontem em torno da demissão de Vitor Gaspar já era um facto previsível algum tempo, pelo menos para um seguidor atento da realidade política portuguesa.