Fábula Guineense: O Jagudi e o Falcão


“À sombra duma árvore, um alto poilão secular descansa tranquilo um Jagudi (abutre). No mesmo ramo em que ele assenta, caiado pelos dejectos brancos de tantos que por ali passaram, veio pousar um falcão. Depois de trocarem cumprimentos, o falcão sempre palreiro e irrequieto, increpou o jagudi de desprezível, de cobarde, madraceiro e quantos nomes lhe acudiram à sua cabeça, louca e leviana. Chamou-o e tornou-o a chamar o ser mais miserável da criação. 
O Jagudi, paciente, ouviu tudo e não teve o mínimo gesto de protesto, de indignação sequer. Nisto, porém, em grande velocidade, passou entre os dois uma avesita de penas multicores. 
Doido, desordenado, o falcão lançou-se em perseguição da ave; mas tão desastradamente o fez, que, de encontro a um tronco robusto foi bater em cheio com o peito. Louco, cheio de dor, piando e repiando, caiu ao chão, exânime, sobre as folhas secas. 
Nesta altura, o abutre, lentamente, levanta o vôo e vai poisar sereno, junto ao moribundo. O falcão, nas vascas da agonia, ainda poude ver, a seu lado, cheio de horror, a silhueta tenebrosa e agoirenta do jagudi. E trémulo perguntou: 
– Que vens aqui fazer? 
Grave e imperturbável, o abutre respondeu: 
– Aguardo o teu fim.”  

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(Citado ilustrativamente por Álvaro Nóbrega, in “A Luta pelo Poder na Guiné-Bissau”, p. 23, Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa, 2003).