Tenho
sérias dúvidas e dificuldades em admitir que o guineense é mesmo patriótico, tal como faz
questão de transparecer no seu quotidiano. Se tivesse realmente amor à pátria o
nosso país não estaria seguramente na deplorável situação de miséria em que se
encontra ao longo dos anos. Por isso, a efusiva manifestação de patriotismo por
parte da generalidade do nosso povo não passa de uma autêntica arte da hipocrisia
para ludibriar os menos atentos ou uma mera ignorância da realidade. Colocar o
simbólico lenço da bandeira no pescoço e proclamar publicamente para todos os cantos
a “guineendadi” não consubstancia o patriotismo. Ser patriota é muito mais que
isso. É ter um genuíno amor pela pátria e defendê-la até às últimas
consequências da subjugação, do abuso, da infâmia, da humilhação, da
arbitrariedade, da tirania e da pobreza, etc. Não vale nada um povo que não
sabe defender a honra da sua pátria, dizia um ilustre pensador. E para defender
a honra da pátria isto remete-nos indubitavelmente em defesa dos nobres Valores
da Democracia Participativa e o cumprimento efectivo dos mesmos, contando com o
manifesto apoio dos nativos do país. Acontece que, para infelicidade nossa,
este intento não tem estado a ser materializado na Guiné-Bissau por causa de
“cabalindadi” dos nossos políticos e governantes em particular.
Por
conseguinte, este patriotismo tautológico em torno da nossa selecção de
futebol no CAN do Egipto é o reflexo da hipocrisia e ingenuidade que
caracterizam a maioria dos guineenses. Como é que se pode vibrar neste momento
com os “Djurtus”, sabendo que o nosso país está refém e corre sérios riscos de
vir a entrar numa convulsão? Há razões justificáveis para estar assim tão
mobilizados em torno do CAN e, ao mesmo tempo, estar a assistir
indiferentemente às nossas crianças barradas à Escola e muitas pessoas pobres a
morrerem nos hospitais? O futebol é mais importante do que a Democracia e acção
governativa? O futebol pode assim melhorar a nossa qualidade de vida e dar-nos prestígio que não conseguimos obter no
campo político-governativo? Se os guineenses são assim patriotas, porque
deixaram o Presidente Cessante condicionar ainda o nosso futuro colectivo,
colocando em causa as vidas de muitos dos nossos inofensivos concidadãos?
Alguns,
antecipando possíveis respostas, certamente dir-me-ão que uma coisa não tem
nada a ver com a outra e o desporto sempre foi agregador em toda a parte do
mundo. A meu ver, sem dúvida, tudo tem a ver. É um corolário axiológico. O
futebol só é autenticamente agregador quando um país assegura o mínimo
indispensável para a sua sobrevivência e manutenção, que não é o caso da
Guiné-Bissau. Nada, neste momento, está a funcionar no nosso país. Está tudo
parado. O aparelho de Estado está paralisado, com as graves implicações
humano-socais que isto acarreta na vida e sobrevivência da generalidade dos
guineenses. Temos pessoas a passarem fome e em situações de grandes aflições.
Onde é que está, então, a razão suficiente para estar contente com os “Djurtus”
e ficar eufórico com a sua prestação futebolística? É a isto que chamam
patriotismo? Se realmente é a isto que chamam de patriotismo, tal como deduzo
ser a convicção enraizada da parte significativa dos guineenses, não contem
comigo. Estou fora disso. Mesmo fora.
Roubem-me o esforço e a tranquilidade; a dignidade e o bom senso é que não!