O Uso do Cabelo Humano: Uma Descaracterização da Identidade da Mulher Africana

A temática da beleza tem sofrido revezes significativos, a todos os níveis, nas últimas três décadas, impulsionado máxime a crescente globalização e influência inquestionável das grandes agências de moda, coadjuvadas pelos media que, de forma lobby-imperativa, ditam as tendências e padrões universais da moda e beleza. Estas mudanças comportamentais, a nível da estética e de beleza, com efeito, tiveram mais impactos perniciosos nas mulheres em geral, particularmente nas mulheres africanas – por serem o elo mais fraco em toda esta crescente dinâmica multicultural da pós-modernidade a que estamos submergidos. Por isso, a mulher africana confronta-se, cada vez mais, com seríssimas crises de identidade ideológico-cultural sem precedentes, apostatando deste modo o seu substrato de africanidade, numa amálgama paradoxal de falso empoderamento feminista, procurando debalde conquistar a legitimação de terceiros (dos homens, bem entendido). Mulheres que, na generalidade das situações, já não se revêm tanto no conceito de africanidade, tendo inclusive repulsa dela, assumindo-se despudoradamente de modernas, mas que não conseguem assimilar na perfeição a mundividência do mundo Ocidental e serem aceites, tal como almejariam. 

E justamente por todas estas vicissitudes que as nossas mulheres fazem de tudo para parecerem com as europeias, procurando renegar as suas idiossincrasias, traços, feições, hábitos e costumes, fisionomia, estética, tom de pele e africanidade. O complexo de inferioridade com o seu cabelo natural é mais um dilema num conjunto de dilemas que encerra o paradoxo da mulher africana. O cabelo humano, em abono da verdade, não confere pergaminhos à mulher africana e, tão pouco, estatuto ou qualquer tipo de afirmação social. Não lhe acrescenta a beleza e a honra. Não lhe torna destacadamente bonita, antes pelo contrário retira-lhe o brilho e a sua peculiaridade tropical, ofuscando de forma drástica a sua beleza natural, reduzindo-a à inferioridade perante as outras mulheres. 

Com isso, não estamos a pôr em causa o perfil multifacetado que está inerente à mulher na forma de se apresentar perante os terceiros. Não estamos a colocar em causa a liberdade que assiste às mulheres africanas para se exibirem como bem entenderem no seu círculo de convivência. Não estamos igualmente a pôr em causa a vaidade feminina e a sua autodeterminação em todas as dimensões.  Da mesma sorte não estamos a negar às nossas mulheres a faculdade de, forma livre e unilateral, aculturarem-se aos padrões predominantes da beleza do mundo Ocidental ou qualquer outro tipo de cultura que julgassem mais conveniente para se sentirem auto-realizadas. Nada disso é a nossa pretensão nesta esboçada crónica. Os gostos não se discutem, diz peremptoriamente a sabedoria popular. E mais, importa ainda salientar, não estamos a ser alheios às constantes pressões que as próprias mulheres africanas vivem no seu quotidiano no que concerne à sua apresentação físico-visual, sobretudo por parte dos homens. Estamos plenamente cientes de toda esta triste realidade. O que estamos a questionar, e concomitantemente a refutar, é um amplo acolhimento que o cabelo humano tem tido no seio das mulheres africanas em detrimento do afro, desvalorizando completamente este pela opção preferencial daquele como sendo um requisito indispensável para se estar bonita. Só se é bonita quando se coloca o cabelo humano, entende equivocadamente a generalidade das mulheres africanas, desprezando assim a carapinha. Há mulheres que até têm vergonha de ostentarem o seu cabelo natural, preferindo reiteradamente refugiar-se no afamado cabelo humano. Não se sentem bem com o seu cabelo afro por considerarem-no pouco atraente, feio e desprestigiante. Não lhe reconhecendo o mérito e a dignidade devida ao ponto de sentir orgulho nele, optando inversamente por disfarçá-lo com cabelo humano de proveniência bastante duvidosa. Muitas mulheres africanas só se sentem bonitas quando estão ornamentadas com cabelo humano ou consideram bonitas as suas congéneres quando estas também colocam o mesmo cabelo. 

Ora, é este entendimento redutor, complexado e descabido que somos manifestamente contra. O cabelo humano não acrescenta beleza à mulher africana e nem lhe torna mais bonita, insistimos. O cabelo humano, antes pelo contrário, consubstancia uma autêntica descaracterização da identidade da mulher africana em todas as suas dimensões.