Um Epílogo Sentimental de Quem Muito Sofre II


«Senhor, meu Deus e salvador,
de dia e de noite te peço ajuda.
Aceita a minha oração,
atende a minha súplica! 

Estou cansado de tanto sofrer,
encontro-me às portas da morte.
Já me podem contar entre os mortos,
pois estou completamente sem forças.
Estou abandonado entre os que morreram;
sou como aqueles que já foram enterrados,
sou como os que foram separados de ti
e dos quais já te não lembras.
Lançaste-me no abismo mais profundo;
nas profundezas da escuridão.
A tua indignação pesa sobre mim;
humilhas-me com tantas aflições.
Afastaste de mim os meus amigos;
fizeste-me insuportável para eles.
Estou como um preso que não pode escapar.
Os meus olhos apagaram-se de sofrimento.
Todos os dias te invoco, Senhor,
e levanto as mãos em oração. 

Acaso farás milagres para os mortos?
Poderão os mortos levantar-se e louvar-te?
Poderá alguém anunciar no sepulcro a tua bondade,
ou no reino da morte a tua fidelidade?
Conhecerão as tuas maravilhas no reino das trevas
e a tua generosidade na terra do esquecimento? 

Eu, porém, Senhor, clamo por ti;
de madrugada te dirijo a minha oração.
Por que me rejeitas, Senhor,
e desvias o teu olhar?
Desde a mocidade que ando aflito e atribulado;
tenho suportado os terrores da tua ira.
Por cima de mim passou a tua grande indignação;
os teus ataques aniquilaram-me.
Rodeiam-me todo o dia, como vagas,
como uma inundação, que me afoga.
Afastaste de mim amigos e companheiros;
a minha companhia são as trevas.» 

(Poema de Hemã, natural de Canaã, Salmo 88:1:19, A Boa Nova Em Português Corrente, Lisboa, Sociedade Bíblica de Portugal, 2004).