Barriga de Aluguer


A barriga de aluguer é um tema extremamente sensível a todos os níveis e concomitantemente controverso, sobretudo pelos casais inférteis e mulheres portadoras de lesões no útero (LER). Mesmo assim, não admito qualquer tipo de excepção para legitimá-la socialmente. Sou manifestamente contra tal prática em todas as circunstâncias, contextos e situações, por três importantíssimas razões: 

(1). É bastante discutível em casos de disputa judicial entre a mãe dadora de gâmetas e a mãe gestante conferir razão a uma delas, ignorando os profundos sentimentos da outra parte envolvida. As duas mães têm toda a legitimidade para reclamar a pertença do filho, tendo em conta a familiaridade que nutriram pelo nascituro desde a sua concepção (e não me venham falar do prévio contrato assinado entre as duas para conferir razão à mãe dadora de gâmetas, visto que nenhum contrato poderá pôr em causa a moral assente e os bons costumes. No âmbito internacional, a título exemplificativo, há praticamente unanimidade doutrinária por parte dos jurisconsultos quanto à presunção da maternidade, ou seja, é mãe quem gera o filho. É uma presunção inilidível). 

(2). A paz social da criança objecto de barriga de aluguer. Não há decisão judicial que possa demover definitivamente uma das mães que perderam a custodia do filho. Ela vai sempre continuar a insistir que o filho é dela, inclusive maquinar planos extrajudiciais para reaver o seu filho, e com todas as implicações humano-sociais que isto representará na paz social da criança e no seu desenvolvimento saudável. 

(3). A relativização e banalização do nobre papel da maternidade. Uma lei que, a priori, é genuinamente pensada para ajudar os casais inférteis e mulheres que não dispõem de útero poderá automaticamente traduzir-se em alimentar os caprichos de algumas mulheres da alta sociedade que, por razões de estética e pavor à maternidade, poderão querer usá-la para assim fugir ao parto, bem como germinar a “comercialização” de crianças, mesmo havendo critérios apertados na sua disposição. É fácil, com ajuda de profissionais de saúde sem escrúpulos, conseguir “atestados” para dar seguimento dolosamente a tal prática. 

Além destas razões acabadas de se mencionar, acrescem ainda os pertinentes argumentos invocados outrora pelos juízes do Tribunal Constitucional no seu Acórdão 225/2018 para declarar inconstitucional com força obrigatória geral o primeiro projeto-lei sobre esta temática, que integralmente subscrevo (ALI)(AQUI). Podia ainda desdobrar-me a falar sobre a problemática a nível da paternalidade da criança sujeita a barriga de aluguer e questões de ordem ético-moral que ela encerra, etecetera, no entanto entendo ser inoportuno fazê-lo neste brevíssimo artigo. 

Sou, em suma, convictamente, contra legalização da barriga de aluguer. Se os casais não conseguem ter filhos podem, por via da adopção, tê-los evitando assim imprevisíveis constrangimentos, transtornos, disputas judiciais e problemas axiológicos desnecessários.