“Os Mandingas,
agricultores-criadores de gado e comerciantes, vieram do Niger Superior. Foram
quase totalmente islamizados com exceção do reduto dos Soninkés[1]
na região de Oio. Ameal defende que os mandingas de Farim são soninkés
posteriormente mestiçados com Núbios e Etíopes. Eles chamam-se Mandikó-lu
(Mandinkó, Mandingó). Este etnónimo está filiado ao de Malinké ou Mandinké,
nomes formados de Mali (Mandên) e nké “homem”, “pessoa”, “habitante”. Segundo
André Arcin, a grande família Mandé à qual pertencem os Mandigas, incluía muitas
populações reagrupadas em dois clãs: um que vivia na época pré-histórica sob protecção
do Totem Ma e o outro que estava sob a protecção do Totem So. O povo do clã Ma
ter-se-ia instalado no sul e teria participado na criação do Império do Mali.
Os do clãs So, ao norte, seriam os Soninkés (So + nkeo = pessoas do clã So),
fundadores do Império do Gana.
Delafosse fala do grupo
Mandé, dos quais os Mandigas e os Malinké constituem as subdivisões. De entre
os numerosos estudos linguísticos sobre
este grupo, citamos o Homburger que associa à língua Mandé, os Bozos, Bambaras,
Malinkés, os Djolas, os Cassangas e os Soninkes. Para S. Wilson, na Guiné-Bissau
fazem parte deste grupo os Mandigas, os Jacandas, os bambaras, os Sossos e os
Saracolés.
Mantemos as primeiras
referências sobre o Mandigas da actual Guiné-Bissau, de Diogo Gomes e mais
tarde de Duarte Pacheco Pereira e de André Alvares de Almada (1594). Após a
leitura dos testemunhos de Coelho e Almada, Artur Augusto da Silva situa em
meados do século XV, a presença dos Mandingas na região situada entre a margem
sul do rio Gâmbia e a terra de Guinala, junto das quedas de Corubal.
Referindo-se à tradição oral, George Brooks relata que os membros do clã Fati seriam o primeiro
grupo de língua Mandé a chegar ao alto do rio Gâmbia. Ainda de acordo com as
mesmas fontes, os do clã Sane teriam descido a partir do nordeste em direcção
ao que é hoje a Guiné-Bissau, fixando-se em Muru, perto de Badiar, em Kitchara,
perto de Kade e em Bassung, a montante do rio Geba, na região Biafada chamada
Degola.
Quando chegaram os
portugueses, os Mandigas exerciam o seu domínio sobre a maior parte da região,
da Gâmbia a Geba, e estavam organizados em vários reinos: Cantor, Niani, Uli,
Cabu e Brasso. O rei de Cabu (que se tornou Gabú) tinha colocado em “vassalagem”
as populações Balantas, Biafadas, e regiões inteiras (Maná, Tumaná, Propana,
Chanha, etc). Foi com a revolta dos Fulas[2],
e com a chegada de outros grupos Fulas de Fouta Djallon que vieram libertar os seus primos, que a
hegemonia Mandiga terminou. Gabú foi
posto sob a dependência de Labé e os Mandigas submetidos ao reiuno Fula.
De acordo com Ameal, os Mandigas consideram os Balantas,
os Brames e os Biafadas como seus parentes próximos. A partir do século XVI, os
Balantas, os Soninkés, os Brames, os Floup, os Baiotes, os Cassangas e os Banhuns
sofreram a influência Mandiga. Estes últimos conseguiram subjugar e assimilar
uma parte destas etnias e a empurrar a parte “rebelde” para as costas do
litoral”.
(Extraído no livro do Professor Tcherno Djaló, in O
Mestiço e o Poder [Identidades, Dominações e Resistências na Guiné-Bissau],
Veja, 2012, Lisboa, p. 66 e 67).
[1] Os
Sonínkes, chamados Saracolés pelos Europeus, são uma população que habita na
região situada entre a Casamança e o rio Farim e que sofreu a “mandinguização”,
isto é, completamente assimilada pelos Mandigas. É comummente admitido que,
etnicamente, os Soninkés fazem parte do grupo mandé. Segundo José M. de Braga
Dias, eles nomeiam-se também Oincas ou Mandigas de Oio.
[2]
Estabelecidos no Gabú a leste e em Farim ao norte, os Mandigas assistiram à
invasão Pacífica dos Fulas que, chegando pelo Gabú, aí se instalaram, pagando
um tributo aos Mandigas. As rivalidades entre os dois grupos estão na base de
batalha muito mortíferas das quais as mais importantes são Bere-Colon em 1850,
o ataque de Gan-Salá, feudo dos Soninkés, tributários dos Mandigas a 19 de maio
de 1864 pelos Fulas revoltados e a derrota dos Mandigas na batalha de Turu-Bã
(1866). Turu-Bã é uma expressão que significa “acabada a semente” alusão feita
ao número de Mandigas mortos, tal ponto que já não poderão recuperar a sua
antiga hegemonia.