A Efemeridade da Vida e a Morte da Rainha Isabel II


Atribui-se ao monge agostiniano Tomás de Kempis a autoria da célebre frase latina “sic transit gloria mundi”, que numa tradução aberta significa “toda glória do mundo é passageira” ou “o quão rapidamente passa a glória do mundo”. Os filósofos antigos interligavam simultaneamente a noção da glória, poder e prazer como sendo corolário axiológico da suma felicidade do Homem e do seu triunfo final nesta vida, sobretudo no pensamento utilitarista de Jeremy Bentham, John Stuart Mill. Tomás Hobbes vai ao ponto mesmo de considerar que somente o soberano detém realmente o poder – seja ele um homem ou uma assembleia de homens –, razão pela qual deve exercê-lo de forma coerciva e absoluta. 

Sabemos, no entanto, pela experiência prática, que o poder é limitado. A glória do mundo e seus prazeres são efémeros. A vida um dia terminará com a funesta morte. Os moralistas Cristãos nas suas visões deterministas sobre a natureza da vida obser(va)vam que se o homem se apercebesse com prematura sabedoria do facto de a vida terminar numa radical inutilização e de todo o poder e riqueza acumulada em vida não poupar ninguém da decadência e da morte, veria o absurdo do esforço e a natureza pírrica de todo o triunfo – e cairia, por isso, na contemplação e na indolência, contente, resignado com a pobreza resultante da sua sábia improdutividade. 

Consciente a priori desta manifesta e inequívoca verdade antropológica, o rei Salomão qualificava peremptoriamente o poder humano e toda a glória do mundo de “vaidade de vaidades! Tudo é vaidade e aflição do espírito”, concluindo que “nem do sábio nem do ignorante ficará recordação que dure para sempre. Com o passar dos tempos, tudo se esquece. Tanto morre o sábio como o ignorante (…) o destino dos humanos e o dos animais é o mesmo; tanto morrem uns como os outros; o sopro da vida é o mesmo para todos. O homem não tem melhor sorte do que o animal: é tudo uma ilusão” (Eclesiastes 1:2; 2:16; 26; 3:19). 

A vida é vulnerável, frágil e fugaz. Tanto que, por esta razão, os autores sagrados convergiam em apelidar a vida de “sopro”, “neblina” e “sombra passageira”, confirmando assim a sua transitoriedade e finitude. O rei David, no seu famoso salmo, considerava que “o homem é como um suspiro; a sua vida passa como uma sombra” (Salmo 144:3). O servo Tiago questionava os seus leitores em tom exortativo: “que é a vossa vida? Sois um vapor que aparece por um pouco, e logo se desvanece” (Tiago 4:14). Por isso, somos reiteradamente advertidos a deixarem “de confiar no homem! Ele não é mais que um sopro. Que valor tem ele, então?” (Isaías 2:22). 

A morte é uma garantia certa na vida de todos os seres humanos. Viver é sinonimo de morrer. Temos todos que morrer um dia, infelizmente (Génesis 3:1-24). É um facto assente e consumado. Cada um de nós terá de acertar contas com esta inexorável dizimadora de vidas. Por isso, desde os velhos até aos mais novos, sem excepção, a morte colocará todos debaixo do seu domínio. Seremos todos consumidos por ela. Teremos que confrontar-nos com este fatídico destino das nossas vidas de múltiplas formas. Cada um à sua sorte. Uns mais cedo que os outros. Queiramos ou não. Somos destinados a morrer um dia – voltar novamente ao pó da terra de onde outrora proviemos (Génesis 2:7; 3:19). Somente a graça redentora de DEUS, através do sacrifício expiatório do Seu Filho Unigénito Jesus Cristo, poderá conferir-nos a vitória definitiva sobre a morte. 

Ontem à tarde a rainha Isabel II morreu para a surpresa de praticamente todo o mundo, visto que na terça-feira estava aparentemente bem na investidura da nova Primeira-Ministra do Reino Unido e com sorriso rasgado, tal como do costume. A querida, "consensual", famosa, influente e poderosa “rainha das rainhas” sucumbiu perante a morte. Não conseguiu resistir a tragedia da morte.  A matriarca da família real britânica morreu. “A Rainha morreu tranquilamente em Balmoral, esta tarde”, referia o curto comunicado oficial do Palácio de Buckingham. A rainha Isabel II morreu para ser julgado pelo seu legado político e pela História universal. É mesmo fim de um longo ciclo político. Era um desfecho previsível. Assim passa a glória do mundo. A vida e a glória do mundo são realmente passageiras...