Conta Timothy George, na sua célebre obra “Teologia dos Reformadores”, que quando João Calvino morreu Beza, que esteve com ele até ao fim, desabafou inconformadamente da seguinte forma: “nesse dia, com o crepúsculo, a mais brilhante luz que já houve no mundo para a orientação da igreja de Deus foi levada de volta para os céus”. No caso do Evangelista-missionário Billy Graham diria que a Igreja perdeu um distinto embaixador da Boa Nova da Salvação, um fiel discípulo do Senhor Jesus Cristo, um grande gigante do Cristianismo. Naturalmente que estes dois proeminentes servos do Altíssimo não foram homens imaculados nas suas actuações com DEUS e o próximo em geral, tal como nenhum outro homem à face da Terra o é. O Senhor Jesus foi o único Homem Perfeito que, na Sua humilde encarnação, viveu de forma irrepreensível e sem pecado algum (2 Coríntios 5:21; 1 Pedro 2:22).
Mesmo os grandes heróis da fé, descritos de forma enaltecida no capítulo onze do livro de Hebreus, tiveram recaídas espirituais, profundos desvios comportamentais e alguns deles cometeram pecados horripilantes. E a mesma realidade se aplica aos Apóstolos, os País da Igreja, os Reformadores Protestantes (LER) e (VER) e os Santos de DEUS de todos os tempos. Por isso, as Escrituras advertem-nos a não confiar em homem algum, porque “maldito o homem que confia no homem, e faz da carne o seu braço, e aparta o seu coração do Senhor!” (Jeremias 17:5). Estes homens e mulheres, apesar das suas limitações humanas, “por meio da fé, conquistaram reinos, estabeleceram a justiça e alcançaram as promessas de Deus” (Hebreus 11:33). É neste prisma que deve ser vista e entendida a vida e obra do Evangelista Billy Graham. Conseguiu, com o seu poderosíssimo testemunho de vida, levar o Evangelho para os pobres e ricos, homens e mulheres, os doutos e indoutos, os príncipes e os plebeus. Gastou toda a sua energia para fazer DEUS conhecido no mundo inteiro. Foi a pessoa que, pela graça Divina, mais evangelizou o maior número de pessoas na longa História do Cristianismo, inspirando simultaneamente milhares de Pastores, Missionários, Líderes espirituais e milhões de Cristãos de várias denominações nos quatro cantos do mundo.
Portanto não compreendo as duras críticas de que tem sido objecto por algumas pessoas e os media em geral, procurando a todo o custo obnubilar este seu importantíssimo e inquestionável legado do “obreiro aprovado”. É verdade que Billy Graham ficou bastante aquém em determinadas questões político-sociais em que deveria ter tido uma posição mais vigorosa e condizente com a impoluta revelação bíblica, nomeadamente a sua inicial relutância em não apoiar o Pastor Baptista Martin Luther King na sua legítima luta contra a segregação racial nos EUA, as suas secretas apologias antissemitas, o apoio implacável à guerra do Vietname e insensibilidades sobre o aquecimento global. Contudo, quanto a estes momentos menos felizes do Evangelista-pregador, teve a oportunidade de reconhecer posteriormente o seu erro nessas pertinentes temáticas, pedindo publicamente perdão (LER).
De forma analógica, o Teólogo João Calvino afectou a sua austera imagem com a aprovação da execução na fogueira do médico espanhol Miguel Serveto, condenado por heresia contra a Trindade, em 1553, em Genebra (ALI) e (AQUI). Mas, no fim da sua vida, morreu confessando que “tudo o que fiz não vale nada […] sou uma criatura miserável” (LER). O Reformador Martinho Lutero (LER) foi considerado precursor de um modelo de Estado dominador ou de autoridade, falando-se mesmo em “Estado de Obediência”. A configuração da desobediência como pecado tão grave como assassínio, escrevia o Professor Paulo Otero, levou “Lutero a condenar severamente os camponeses insurrectos, se resultava da natureza divina dos príncipes, traduzia também um entendimento que via no povo comum a própria figura de Satanás, motivo que leva a afirmar “antes quero um príncipe que não é justo do que o povo justo”. E com isso foi apelidado em vários círculos intelectuais como defensor do absolutismo de Estado e do capitalismo moderno – com todas as agravantes negativas que isto acarreta do ponto de vista de Direitos Fundamentais (LER).
Sabemos, no entanto, que Lutero reconheceu manifestamente a sua incapacidade e inconstância quando estava a ser equivocadamente venerado pelos seus seguidores. “Que é Lutero?”, questionava inconformadamente, “o ensino não é meu. Nem fui crucificado por ninguém. (…) Como eu, miserável saco fétido de larvas que sou, cheguei ao ponto em que as pessoas chamam os filhos de Cristo por meu perverso nome. (…) Simplesmente ensinei, preguei, escrevi a Palavra de Deus; e não fiz mais nada (…) A Palavra fez tudo”, resumia o seu papel na Reforma da Igreja (LER). E podia desdobrar-me a dar muitos outros exemplos de grandes figuras que tiveram momentos infelizes no seu percurso de vida. Quem, porventura, está imune a isso? Neste ponto temos todos “telhados de vidro”. Foi a tal mácula do “pecado original” que acompanha todos os seres humanos, independentemente da sua condição social, inclusive os eleitos filhos de DEUS.
Estes santos homens de DEUS, sem prejuízo de nódoas nos seus currículos, marcaram positivamente o seu tempo como a História tão bem nos testemunhou. E Billy Graham igualmente não é excepção a esta grande verdade. Por isso, reduzir o legado de vida do “Pastor da América” ao ponto de considerar que “estava do lado errado da história”, tal como erradamente defende Matthew Avery Sutton no seu artigo de opinião no “The Guardian”, não corresponde à mínima verdade (LER). É um falatório inútil, sem qualquer tipo de sustentáculo. Billy Graham foi um homem que combateu o bom combate da fé, dando o poderoso testemunho do Evangelho, “dentro e fora do tempo”. Vamos, todos os Filhos de DEUS, sentir imenso a sua falta.
Em suma, na morte de João Calvino sustentava Penning para ilustrar o luto incomensurável que invadia a cidade do Reformador Protestante nestes termos: “Genebra lamentou-se como uma nação lamenta quando perde seu benfeitor”. Também digo sem qualquer tipo de hesitação prévia que a comunidade Evangélico-protestante Mundial, e os Baptistas em particular, perdeu com a morte de Billy Graham um arco de criatividade, um missionário nato, um servo fiel, um Pastor das almas, um proclamador do Evangelho da Salvação, um humilde colosso da fé. Sim, “o Senhor o deu, e o Senhor o tomou: bendito seja o nome do Senhor” (Jó 1:21). Que assim seja. E assim sempre será.