O
Eng. Amílcar Lopes Cabral estaria hoje a celebrar cem anos de vida, isto é, se
estivesse ainda vivo. Quis o destino que, por razões de intrigas e traições no
seio do PAIGC, foi brutalmente assassinado na flor da idade, com apenas 49
anos, frustrando assim o seu desígnio do “programa maior” visceralmente ligado
ao desenvolvimento sustentável e sustentado da Guiné-Bissau.
O
Eng. Amílcar Lopes Cabral atraía imensos inimigos perante os seus
correligionários do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo-verde
(PAIGC), não obstante o seu humanismo social que era patente nos retratos da
guerra. Era um homem extremamente culto e defensor acérrimo de causas humano-sociais,
especialmente da autodeterminação dos povos africanos. Notava que ele realmente
amava as pessoas, não obstante as leituras que cada um poderá fazer da
exequibilidade do seu projecto governativo e legado político. Foi, sem dúvida,
um político africano ímpar, brilhante, extraordinário e completamente
comprometido com o seu povo que, tal como o próprio manifestou publicamente em
inúmeras ocasiões, “quis saldar a sua dívida para com o seu povo e viver a sua
época”.
Mesmo
assim, os seus opositores por rivalidades, ciúmes e inveja, catalogavam-lhe
vários epítetos pejorativos para arruiná-lo na sua determinada luta da
autodeterminação da Guiné-Bissau e Cabo-Verde, até ao ponto de liquidarem
definitivamente o homem (LER). O Eng. Amílcar Cabral, para grande
tristeza nossa, não chegou de “saldar” completamente a sua dívida com o seu
povo e também não viveu a sua época como almejava. Partiu prematuramente,
deixando muitas e grandes iniciativas político-governativas para materializar
na Guiné e Cabo-Verde. Tudo foi muito rápido e funesto na sua vida. As suas revolucionarias
ideias políticas foram, no curto espaço do tempo, aquando da sua morte,
rapidamente adulteradas e preteridas pelos altos dirigentes do PAIGC, lançando a
Guiné-Bissau num pântano de bloqueio político e de completa ingovernabilidade, ao
longo das décadas, até à data presente.
Por
isso, a Guiné-Bissau é um país fracassado a todos os níveis. Vive
inveteradamente pelas ruas da amargura. Nunca teve, desde a sua História de
autodeterminação, responsáveis políticos à altura do exigente desafio
governativo. Foi sempre conduzida por pessoas medíocres, incompetentes,
corruptas e manchadas pelos crimes de sangue. A arbitrariedade, o nepotismo, o
clientelismo, a obstrução da legalidade, o abuso de poder, o revanchismo e a
impunidade são vícios arreigados que, para nossa infelicidade colectiva,
caracterizam o destino trágico do país. Os órgãos de soberania são
instrumentalizados, tornando-se reféns de interesses obscuros de uma certa
minoria que, de forma presunçosa e impune, fazem e desfazem a seu bel-prazer a
Res Publica.
A
crónica crise institucional que opõe os órgãos de soberania e partidos
políticos podendo, inclusive, deteriorar ainda mais o já inabilitado Estado do
país é o reflexo manifesto de tudo o que acabámos de sustentar. Temos um
ditador como Presidente da República que desconhece absolutamente as suas
atribuições constitucionais e um dos factores de instabilidade no país, bem
como uma Assembleia da República completamente descaracterizada do seu substrato
legislativo. Deputados sem escrúpulos, para não dizer outra coisa, que vivem à
mercê de circunstancialismos e favorecimentos. Um Governo ilegal composto por
fraldiqueiros que tão bem conhecemos em outros carnavais, somando-se ainda um
licencioso poder judiciário susceptível de ser peitado a troco de um bom “suku
di bás” para perverter a Justiça. Todos estes pejorativos adjectivos aplicam-se
na perfeição à nossa insubordinada e corrupta classe castrense. Estamos
desgraçadamente entregues, sem dúvida, a embusteiros e traidores da pátria. Só
pano tchora dur garandi: Guiné-Bissau kaba sim Cabral!
