Herança Litúrgica


Sou um assumido fã incondicional de louvor e adoração com os hinos. Sinto-me mais “próximo” de DEUS ouvindo e cantando os tradicionais hinos Evangélico-protestantes, sem prejuízo obviamente de reconhecer o devido mérito a alguns belíssimos cânticos que também são entoados no nosso meio Cristão. Nutro uma simpatia bastante especial para com os hinos. Sempre foi assim desde criança. Julgo que os hinos nos protegem, da melhor forma possível, das heresias litúrgicas que a generalidade dos cânticos promove sorrateiramente nas nossas congregações. Há louvores que mais parecem “concertos” do que propriamente um autêntico “culto racional” ao nosso Santíssimo DEUS, tal como inspiradamente requerido nas Escrituras Sagradas (Romanos 12:1; 1 Coríntios 14:20-40). 

Tenho imensa pena que os tradicionais hinos estejam, cada vez mais, a ser relegados para segundo plano nos nossos cultos congregacionais em detrimento da “pomposa adoração” dos cânticos (alguns deles de proveniências e mensagens teológicas duvidosas, infelizmente). Há igrejas em que os hinos já não fazem parte da sua liturgia, entrando assim flagrantemente em contradição com uma das grandes heranças da Reforma Protestante e da nossa Fé Cristã. Jamais pactuarei com esta redutora mundividência eclesiástica. Os hinos fazem parte do substrato identitário da nossa Fé Reformada e também Cristã, insisto. Consubstanciam, sem margem para dúvidas, aroma agradável de adoração. Não podem, por isso, em circunstância alguma, caírem em desuso cultual como é cada vez mais notório em muitos círculos Protestantes, sob pena de estarmos deliberadamente a apagar parte importantíssima da nossa herança Cristã. 

Esta preocupante desvinculação na entoação dos hinos nas nossas Igrejas deve-se, a meu ver, à galopante e reiterada “instrumentalização” e “mundanismo” a que o louvor e adoração têm sido votados nos últimos séculos – fruto de uma abordagem “libertadora”, catapultado, máxime, pelos movimentos carismático-pentecostais e neopentecostais nos finais do século XIX, acabando concomitantemente por influenciar praticamente todas as outras denominações evangélicas neste sentido. A partir do momento em que, por razões doutrinárias, triunfou este “novo” paradigma do “avivamento litúrgico”, os hinos passaram a ser vistos como uma coisa do passado, de velhos e caducos. Os jovens, os recém-convertidos e os crentes em geral, já não se identificam tanto a sua espiritualidade com eles, preferindo refugiar-se mais num louvor pomposo e completamente excêntrico. 

A espiritualidade, importa ainda salientar, é mais voltada para a razão e contemplação do que propriamente à emoção e à ostentação. Os dois últimos são sentimentos, muitas das vezes, efémeros e sem qualquer tipo de repercussão prática no decorrer do tempo. Ao passo que aqueles são consistentes e duradouros. Conseguem conjugar muito bem os aspectos do genuíno sentimento natural com a inabalável certeza da fé. Ter fé não é viver exclusivamente de emoção ou exposição circunstancial e, muito menos, depender inteiramente delas; é viver, em última instância, da espiritualidade lúcida que a mensagem do Evangelho encerra em todas as suas vertentes e plenitude. O nosso Eterno DEUS, exortava peremptoriamente o Senhor Jesus na Sua conversa com a mulher samaritana, “é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade” (João 4:24). Adoremos, pois, de forma ordeira e decente, o Todo-poderoso DEUS em espírito e em verdade. Que assim seja.