Julgo que há um equívoco no que toca ao meu último artigo de opinião sobre o
repúdio que manifestei do fechamento das igrejas por causa do coronavírus (LER). Fiquei
com a impressão de que alguns que caíram neste deliberado equívoco leram
parcialmente o artigo ou não o leram, fazendo com que não
conseguissem extrair o seu alcance teleológico. Desde logo, o objetivo do
artigo em apreço não é secular, mas sim espiritual. Não visa debruçar acerca das
problemáticas epistemológico-científicas do coronavírus e as suas implicações
sociológicas. Também não é colocar em causa as pertinentes recomendações
preventivas que as autoridades estão a dar para minimizar o seu impacto
contagioso e pernicioso na vida das populações e, tão pouco, subestimar os seus
efeitos catastróficos, bem como a boa conduta que se espera de todos os
Cristãos neste momento particular para fazer face definitivamente a esta
maldita doença. A minha questão era denunciar a tamanha incongruência da
Aliança Evangélica Portuguesa e das Igrejas que decidiram fechar prematuramente
as suas portas, usando o descabido pretexto da “prevenção”.
O argumento
que foi usado para tomar esta inédita e radical decisão não se baseou em nenhum
texto bíblico, mas sim nas indicações sanitárias da Direção Geral de Saúde e do
Governo (agora a Cidade de DEUS é regida pela cidade dos Homens? Ou Babilonia
instruirá a Santa Jerusalém?). O mais ridículo de tudo isto é que as
instituições da República Portuguesa estão a funcionar sem grandes
sobressaltos, nomeadamente a Assembleia da República, o Governo, os Tribunais,
bem como as autarquias locais e empresas privadas. No entanto, a Assembleia de
DEUS (as Igrejas de Cristo, bem entendido) estão com as suas portas fechadas.
Que tamanho escândalo espiritual!
Eu ficaria
tranquilo se fosse realmente o Estado português que tivesse a obrigar
imperativamente as Igrejas a encerrar as suas portas por causa da prevenção.
Acontece que, por enquanto, não foi isso. A Função Pública não está paralisada.
As empresas privadas também estão a funcionar, não obstante pontuais
ajustamentos que alguns estão a fazer para se adaptarem ao novo contexto
excepcional em que vivemos. Os transportes públicos estão a funcionar
perfeitamente. Os centros comerciais estão abertos, bem como os restaurantes,
cafés e afins. Todas estas entidades não estão, porventura, preocupadas com o
coronavírus? Porque somente as igrejas têm de fechar as suas portas? Não seria
também normal fazer algumas pontuais alterações, nomeadamente suprimir
determinadas actividades eclesiásticas, aconselhando os irmãos que se enquadram
nos grupos considerados de risco a ficarem em casa, mantendo os cultos
dominicais e até promover os cultos comunitários na rua? Era, a meu ver, mais
sensato espiritualmente proceder assim do que tomar a radical medida de fechar
as portas das Igrejas.
Este
fechamento das Igrejas por causa do vírus do coronavírus remete-nos
indubitavelmente para outros grandes vírus espirituais que estão a ameaçar
galopantemente as igrejas e a consequentemente enfraquecê-las, nomeadamente o
vírus da incredulidade, da sonolência espiritual, da idolatria e do
obscurantismo teológico, do materialismo e da segregação denominacional, da
racionalidade e do liberalismo teológico. O vírus do afastamento e não
engajamento na obra de DEUS. O vírus da falta de fé e de uma vivência
espiritual sem qualquer tipo de expressividade, máxime despida de amor e
perdão. É um vírus acima de tudo de fechamento e de hipocrisia. Fechamento por
tudo o que é sagrado e de DEUS. Fechamento da Igreja para dentro da sua vida
saturada, doentia e cheia de pecados. Fechamento espiritual que se preocupa
mais com as coisas deste mundo, levando-a a não ter o comprometimento com a
oração, a vigilância espiritual, a Evangelização e Missões e com a vida
santificada. É uma Igreja que fecha para as coisas de DEUS e, ao mesmo tempo,
aberta para a novidade do mundo e do mundanismo, razão pela qual está cada vez
mais reduzida, estagnada, envelhecida e sem avanço. É este vírus de
“fechamento” que está infelizmente a arruinar a saúde espiritual das Igrejas.
Por isso, esta pronta opção das lideranças das Igrejas de tomarem
precipitadamente a mais extrema medida de fechamento das portas das Igrejas,
sob o pretexto de estarem a “prevenir”
os crentes do coronavírus veio apenas evidenciar a olhos nus o estado da
indolência espiritual que as igrejas neste momento se encontram – que tem a ver sobretudo com o vírus de
“fechamento” para as coisas de DEUS.
Os Cristãos
que hoje ficaram remetidos dentro das suas casas com medo de passarem duas
horas na Casa de DEUS para não contrariarem o coronavírus, são os mesmos
Cristãos que amanhã se vão levantar sem medo para estarem nove horas no
trabalho e durante toda a semana por aí em diante, ignorando a tal justificada
“prevenção” contra o coronavírus que alegaram para fechar as igrejas. Não será
isto uma contradição? A verdadeira prevenção era deixarmos também de trabalhar
temporariamente para assim ficarmos todos mais “seguros” em casa de quarentena.
E mais,
esta tamanha incongruência consubstancia uma clara falta de fé dos Cristãos.
Não podemos somente falar da fé do ponto de vista genérico e abstrato, sem
vivenciá-la na prática. E viver a fé é inclusive romper as barreiras da
racionalidade, contrariando as incredulidades que se levantam para abafar o
agir poderosíssimo do Espírito Santo. A fé é, acima de tudo, correr o risco. O
risco de ser mal compreendido e considerado louco. O risco de ser rotulado e
contrariado. O risco de ser detestado e perseguido. O risco de desafiar a
lógica e falíveis previsões humanas. O risco de se expor ao perigo aos olhos do
mundo e considerado um fracassado. O risco inclusive de morrer por causa do
Senhor Jesus Cristo. Mesmo assim, continuar inabalavelmente firme nas promessas
de DEUS.
A grande
verdade neste momento é que as Igrejas não podiam, por enquanto, tomar a
radical medida de fechar as suas portas, enquanto que a generalidade das
instituições da República estão a funcionar e as empresas privadas também. As
Igrejas que decidiram fechar ficaram bastante aquém do grande desafio da fé que
se espera dos Filhos de DEUS, mormente de oferecer a mensagem de amor, perdão e
esperança a todos aqueles que estão apavorados com este malicioso surto de
coronavírus. Julgo que a oportunidade que DEUS está a dar-nos com esta pandemia
é, acima de tudo, de começarmos realmente a priorizar a Sua obra e não arranjar
falsos pretextos moralistas para justificar as nossas insuficiências e
incertezas espirituais.